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Uma revolução lenta começou a ocorrer em alguns municípios do Agreste e Sertão, provocada por um recurso natural que até bem pouco tempo não se achava que tinha um grande potencial em Pernambuco: os ventos. É uma oportunidade de desenvolvimento numa região que, com exceção de algumas cidades, recebeu pouquíssimos investimentos. No mês passado, foram inaugurados dois parques eólicos no Estado, o Ventos de Santa Brígida, com sede em Caetés, e Fontes dos Ventos, em Tacaratu, com a capacidade de gerar, respectivamente, 181,9 megawatts (MW) e 80 MW. O primeiro pertence a empresa de origem cearense Casa dos Ventos e o segundo a multinacional italiana Enel Green Power. As duas companhias realizaram um investimento de R$ 1,5 bilhão. Pelo menos mais três parques eólicos estão em construção no Estado e vão demandar um investimento de R$1,8 bilhão até 2017. E, por incrível que pareça, está só no começo. A consultoria Aeroespacial concluiu um mapa eólico de Pernambuco indicando um potencial de 121 mil megawatts (MW) que poderiam ser produzidos pelo ventos. Para o leitor ter ideia, a potência instalada para gerar energia em todo o País é 138,8 mil MW. E a energia eólica está deixando de ser algo insignificante na matriz energética brasileira. Na última segunda-feira, o setor bateu um recorde de produção e gerou 46% da energia consumida no Nordeste.
"A energia que seria possível gerar com eólica em Pernambuco poderia abastecer todo o País. Isso não tem sentido prático, pois continua sendo necessário dispor de outras fontes, mas mostra o enorme potencial energético do vento no Estado", explica o diretor de Inovação da Aeroespacial, Paulo Ferreira. Por que era senso comum que não existia potencial eólico no Estado? Os primeiros estudos realizados eram muito conservadores e a tecnologia era outra. No início dos anos 2000, a torre eólica tinha a altura de 50 metros e a potência para gerar 1 MW. Atualmente, a torre pode chegar a 150 metros (de altura) e ter uma potência para produzir até três MW. "A torre mais alta capta melhor o vento. Por isso, hoje é encontrado potencial eólico em lugares que antes não existia", explica a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), Elbia Gannoum.
O mapa eólico mostra que os ventos da costa pernambucana são fracos e não têm potencial para geração de energia. No Rio Grande do Norte e Ceará as maiores jazidas de ventos estão na costa. No Estado, os lugares com maior potencial estão no oeste, em lugares altos e em alguns municípios à margem do Rio São Francisco, como Petrolina, cidade com o maior potencial. Em segundo lugar vem Santa Maria da Boa Vista, seguido por Floresta. Depois vêm os municípios de Afrânio, Dormentes, Lagoa Grande, Araripina, Cabrobó, Belém do São Francisco, Floresta, Petrolândia e Tacaratu, todos no Sertão.
No entanto, os parques instalados no Estado estão na área que têm potencial, mas não o maior, como é o caso dos Ventos de Santa Brígida - que recebeu um investimento de R$ 864 milhões - e Parque Serra das Vacas que está em construção em Paranatama, também no Agreste. O último empreendimento está sendo construído pela Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf) em parceria com a PEC Energia e será inaugurado em novembro deste ano depois de receber um investimento de R$ 537,5 milhões. "A prioridade em termos de ventos era Rio Grande do Norte, Ceará e Bahia. As prospecções em Pernambuco e Piauí começaram recentemente. Para participar de um leilão de eólica, a empresa precisa apresentar medição de ventos de pelo menos três anos. A região que está em amarelo no mapa começou a ser estudada há mais tempo, apresentando outras vantagens como a logística (as linhas de transmissão), as torres ficam em locais altos - e não precisam ter uma altura grande. Futuramente, serão explorados os lugares de maior potencial em Pernambuco", explica o presidente da Chesf, José Carlos de Miranda Farias. Outro atrativo do Agreste é formado pelas grandes linhas de transmissão que cortam a região.
Além do parque da Chesf, os outros dois que estão em implantação são os Ventos de São Clemente (em Caetés, Pedra, Venturosa e Capoeiras) que terá a capacidade de gerar 216,1 MW e deve entrar em operação em junho de 2016 e os Ventos de Santo Estevão, em Araripina, que vai poder produzir 142 MW com a expectativa de ficar pronto até abril de 2017. Ambos pertencem a Casa dos Ventos que vai empregar mais R$ 1,3 bilhão nos dois empreendimentos, totalizando um investimento de R$ 2,1 bilhões até 2017 - incluindo os R$ 864 milhões empregados no Santa Brígida, que tem torres também nos municípios de Paranatama e Pedra.
"A energia dos ventos estimula desde a economia de pequenas localidades até a indústria de componentes eólicos instalados em Suape, agregando tecnologia. Esse impacto vai continuar porque os parques pagam arrendamento aos donos dos terrenos onde estão as torres", resume o secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Thiago Norões.
Do restaurante ao pequeno agricultor, muitas pessoas tiveram a sua vida modificada em Caetés por causa do parque eólico. "São cinco anos de seca, tento manter o que tenho para quando a chuva voltar. A minha expectativa é de receber um salário mínimo por mês para cada torre, quando elas começarem a girar em novembro. Isso não vai resolver o meu problema, mas ajuda", conta o pecuarista João Barros, que tem três torres instaladas no seu terreno em Paranatama. Para ele, o problema é a estiagem que já reduziu o seu rebanho a 200 cabeças.
A implantação do Santa Brígida impulsionou o crescimento dos serviços em Caetés. O comerciante José Ferreira da Silva tinha um restaurante onde trabalhava mais duas pessoas além dele. Hoje são 18 funcionários e cerca de 600 refeições vendidas diariamente. "Antes do parque, vendia o almoço para comer a jantar. Eram 10 pessoas por dia. Eu quase caí de costa quando chegou uma pessoa de uma firma de engenharia com a primeira encomenda de 300 refeições", conta. Ele está construindo uma pousada porque a "única existente em Caetés não está dando conta do movimento e os engenheiros ficam em Garanhuns".
A principal consequência da implantação desses parques é que o sistema elétrico ficará mais confiável na região e isso resultará em menos apagões, quando a economia voltar a crescer e aumentar o consumo de energia, na opinião do professor Everaldo Feitosa, também vice-presidente da Associação Mundial de Energia Eólica. Ele foi um dos primeiros engenheiros a defender o potencial eólico no Nordeste e transformou conhecimento em participação acionária em três parques eólicos, inclusive o primeiro implantado no Estado que espalhou torres em Gravatá e Macaparana com a capacidade instalada de 25 MW, empreendimento inaugurado em 2010. Os outros dois parques nas empresas em que é sócio ficam no Rio Rio Grande do Norte podendo gerar 151,8 MW e a Pedra do Reino, na Bahia, que produz até 48 MW.
"O Nordeste pode gerar 100% de eólica e poupar água das hidrelétricas graças aos ventos", diz Feitosa. E complementa: "Os ventos do Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco apresentam comportamentos diferentes que se complementam". O melhor horário de produção de ventos no Santa Brígida começa a noite e vai até as 6 horas. No Ceará e Rio Grande do Norte, a geração é maior durante o dia. E como duvidar, de quem há mais de 15 anos, disse que o futuro, na geração de energia da região, viriam dos ventos.
Fonte: JC